Esta crise vem sem manual de instruções, deixo aqui um conjunto de reflexões sobre fatores importantes a ter em consideração nesta fase. A situação é tão atípica e cada empresa e setor vive realidades tão distintas, que é impensável ter as receitas certas.
Quando escrevi em 16 de março Dicas para lidar com o stress financeiro estávamos no início das restrições e foquei-me nos aspetos a que se devia dar atenção imediata: controlo de despesas e acompanhamento e aproveitamento dos apoios disponíveis.
Os empresários têm agora uma noção mais clara do montante dos apoios estatais e do seu enquadramento. Estão criadas melhores condições para avaliar a realidade atual do seu negócio e planear o futuro próximo.
Os apoios estatais em Portugal concretizaram-se em três formatos:
Compensação de custos fixos ⇒ apoio parcial a custos salariais (lay-off simplificado) / isenção temporária de contribuições a cargo da entidade patronal.
Apoio financeiro direto ⇒ apoio financeiro extraordinário a TIs e MOEs / incentivo normalização da atividade (lay-off simplificado).
Adiamento de compromissos ou aceleração de recebimentos ⇒ flexibilização do pagamento de impostos e contribuições / linhas de crédito com juros atrativos e incentivos reembolsáveis sem juros / moratória de empréstimos de entidades financeiras e de subsídios reembolsáveis do Estado / reembolso antecipado de incentivos do Portugal 2020 / diferimento de rendas não habitacionais.
Nestas condições adversas os empresários devem debruçar-se sobre um conjunto de pontos chave que os devem acompanhar nas decisões a tomar.
1 O dinheiro é a chave, o planeamento o método
A realidade do ponto de partida da tesouraria das empresas determinará a sua posição financeira atual, no entanto em todas elas será criado um déficit de tesouraria com tamanho proporcional ao tempo de redução da atividade e ao peso da estrutura de custos.
Os apoios estatais revestem na sua maioria a forma de adiamento de compromissos, compensando apenas parcialmente os custos fixos, pelo que cada dia que passa aumentará o déficit entre recebimentos que desapareceram e compromissos que não diminuíram o suficiente e que sabemos vamos pagar mais à frente.
Como todos os empresários sabem, quando pára o fluxo de dinheiro e a conta bancária se esgota, apenas existem quatro formas de manter o funcionamento de uma empresa, receber mais rápido dos clientes, pagar mais tarde aos credores, aumentar o endividamento (alheio ou próprio) ou vender ativos.
É fundamental medir a sua atual posição de tesouraria e preparar planos previsionais de tesouraria para as próximas 9, 18 e 26 semanas, com cenários dos níveis de atividade possíveis no seu negócio. Introduza o fator mais importante em termos de impacto, o tempo de redução ou inatividade que acredita vai acontecer no seu negócio e verifique se é possível a continuidade. Deve ser tido em conta nos cenários o potencial estado da economia no período de retoma.
Avalie permanentemente os planos e cenários que criou à medida que o ambiente económico que o rodeia se altere. As condições mudam e podem afetar de forma determinante os resultados dos cenários, por isso não desvie a sua atenção por um momento.
Permanecer em pausa ou fechar definitivamente, esta é a decisão mais difícil de qualquer empresário, sobre a qual não se pode enterrar a cabeça na areia e a que voltaremos no final deste texto. Esta decisão deve ser determinada não pela posição de tesouraria encontrada, mas pela capacidade do negócio recuperar do buraco que está a ser aberto. Se o negócio tiver capacidade de recuperação, o endividamento é uma boa opção e resolverá as posições deficitárias de tesouraria.
Se neste momento já concluiu que a continuidade não é opção, então salte diretamente para o ponto 6 .
2 Olhe para o seu mercado
Observe o que está a acontecer com os seus clientes e como estes foram afetados pelo COVID-19 e qual o impacto sobre as encomendas.
Que razões podem levar os seus clientes a alterarem comportamentos, os seus negócios foram afetados por quebra nas vendas ou por dificuldades na cadeia de abastecimento, por imposição legal ou por opção própria? Sendo consumidores finais qual a probabilidade de voltarem aos hábitos de consumo anteriores? Ou podemos antever desde já uma alteração dos seus hábitos de consumo?
Os esforços comerciais devem ser canalizados para regiões/países menos afetados pela crise e para setores/atividades com maior potencial de retoma? Os objetivos de marketing devem ser revistos?
E quanto tempo estimamos que recuperem os níveis normais?
A situação atual pode também trazer novas oportunidades estratégicas para a empresa, na alteração ou adaptação dos serviços e produtos que vende, nos mercados alvo ou no modelo de comercialização que usa habitualmente. Considerar uma alteração radical do modelo de negócio não deve ser desprezada.
3 Importância dos recursos humanos
A sua força de trabalho pode ser o seu maior ativo, o know-how e competências dos recursos humanos qualificados é essencial à sua operação, seja numa empresa de serviços onde são todo o recurso produtivo ou em qualquer outro tipo de atividade.
Mas será que pode mantê-los todos em operação, ou mesmo na empresa? Consegue pagar-lhes o salário, mesmo em regime de lay-off? Consegue suportar as indemnizações se tiver que os despedir? Conhece todas as opções existentes, o enquadramento legal e o impacto financeiro de decisões drásticas nesta área?
4 Verifique as suas cadeias de fornecimento
Observe como as suas cadeias de fornecimento são afetadas e se existem alternativas. Numa economia global e interdependente, a análise da cadeia de fornecimentos é essencial à continuidade da operação, pelo que não se limite a analisar os seus fornecedores diretos, mas também a rede de que dependem.
Além da disponibilidade e funcionamento, avalie as possíveis contingências logísticas, que poderão condicionar os tempos normais de entrega.
Estes fatores associados ao preço deverão levá-lo a fazer novas consultas no mercado e preparar alternativas de back up.
5 Pode precisar de ajuda profissional
Obtenha ajuda profissional se não tiver experiência de situações críticas, ou não tiver a formação ou informação necessária para o conjunto de decisões que poderá ter que tomar.
Procure orientação e ajuda se tem dificuldades em definir a sua situação, fazer planeamento, recorrer a apoios ou necessitar de recomendações.
Privilegie a ajuda qualificada que esteja familiarizada com o seu negócio, região ou que simplesmente lhe transmita confiança.
6 Pausa ou Stop?
Por todo o mundo esta é uma questão que já passou pela cabeça de empresários e gestores independentemente da dimensão da empresa. As empresas devem explorar todas as opções para manter as suas operações vivas, mas simultaneamente precisam ser realistas e ter plena consciência das responsabilidades financeiras, legais e pessoais de uma decisão de encerramento.
Para além da dissolução da empresa por iniciativa própria, que implica condições especiais de capacidade de liquidação das dívidas, existem algumas possibilidades que podem ser exploradas antes das condições de insolvência estarem cumpridas e se poderem tornar ingeríveis.
Esgotados todos os recursos imediatos de viabilização financeira e se concluir pela incapacidade de manter a operação a funcionar de forma normal, mas havendo por parte do empresário a convicção de viabilidade económica da empresa a reestruturação das dívidas é um caminho possível.
São opções legais o regime extrajudicial de recuperação de empresas (RERE), o processo especial de revitalização (PER), e o processo de insolvência com plano de recuperação. Dada a sua especificidade devem ser acompanhados por consultores especializados.
A decisão final de fechar as portas será sempre um processo doloroso e muito pessoal para o(s) proprietário(s) da empresa.
Para quem se debate com este problema, deixo a nota pessoal de alguém que já passou por isso: a quantidade de stress e angústia provocada apenas pela situação é muito agravada pela condição de incerteza, por isso agir o mais cedo possível e enfrentar as consequências pode fazê-lo poupar muito stress e saúde mental.
Na Growfactor estamos preparados e prontos a apoiá-lo com conhecimento e experiência em todas as decisões no âmbito da gestão.
6 pontos-chave para reflexão por parte dos empresários